RESPIRO é o título da  mostra individual da artista carioca Maria Nepomuceno. Há dois anos temos acompanhado o movimento contínuo de seu trabalho. Movimento este que parece também estar impregnado tanto na realidade física das peças, como no próprio fazer da escultura. Digamos que, de alguma forma, Maria vem tecendo a matemática aspiralada de cordas e contas, uma matemática simples porém extremamente sofisticada. O que poderia nos dar a impressão de algo maçante, já que a maioria das pessoas reage desta forma ao ouvir a palavra matemática, no caso destas esculturas é quase mágica. As cordas e contas coloridas  ou não, que Maria usa, de materiais e espessuras variadas, são elementos do cotidiano,  muitas vezes são retiradas  do uso diário, de construções de barcos, de caminhões de mudanças, de cortinas, enfim objetos do nosso dia-a-dia que, apesar de seu valor simbólico e para além dele, existem na obra como o próprio corpo desta. Diferente de uma certa limpeza estética existente no discurso ou no corpo da arte contemporânea,  estes elementos são caminho básico destas construções orgânicas, criando uma continuidade  surpreendida por bifurcações geradoras de braços e mais braços, tubos ,bocas, flores, veias , sistema circulatório, enfim toda uma organicidade fluxus que em alguns momentos se apresentam concentradas em si, em sua unidade de cor material e forma, quando de repente se dissolvem num labirinto de corpos mesclados, misturados, miscigenadas.. A organicidade de suas  obras é tanta que as esculturas se agrupam, se roçam, se tocam, com intimidade e independência, demonstrando simpatia por sua intrínseca vizinhança, que lhe agrega valor sem lhe retirar identidade. Trazem uma espécie tropicalidade para além de pop  e uma visceralidade que se expressa sem pretender ser expressionista, desesperada. Muito pelo contrário, traz no seu corpo uma tranqüilidade do fazer cotidiano de um tempo do acordar viver dormir, de uma vontade de vida vivenciada no carinho do dia a dia como uma arvore que se desenvolve pelas curvas da necessidade simples de sol, terra, água, luz, quem sabe até   um pouquinho de felicidade.
Nas esculturas de Maria a arte se encontra num estado orgânico de  temporalidade inercial, seja pela hipnose da pele-corpo-conta espiralada na complexidade simples do cotidiano de que são feitas, assim como seu jeito relaxado de estar, como paisagens matemáticas de buraco corpos sensorializados que, erguendo-se seres no espaço, se desmancham por um conforto aconchegante que revela uma suave  gravidade.

Diante do excesso de informações do nosso cotidiano, e do meio artístico, o silêncio lúdico dos trabalhos de Maria Nepomuceno, chegam à A Gentil Carioca num ótimo momento. Apesar de nossa luta diária, ainda respiramos, e este respiro traz uma pausa política no discurso do objeto e seu lugar no mundo, abrindo espaço para operar modelos e práticas existenciais, sintonizando um pensamento que sai da natureza e retorna ao mundo através do corpo que age sobre  a corda-linha que tece a pele que se avoluma como síntese de um possível habitat ... um saboroso jardim.
Ernesto Neto