Vários elementos atravessam o processo criativo de Maria Nepomuceno. Dois são mais
evidentes: artesania popular e experimentação plástica. A sua obra combina o fazer da mão
e o delírio da imaginação. As linhas feitas com corda entrançada colorida espalham-se pelo
espaço, sobem (ou descem) pelas paredes e se misturam com as cadeiras, vasos, bolas,
contas e redes. Uma costura infinita e expansiva que sugere uma espécie de escrita feita de
fragmentos decaídos de algum paraíso perdido que vão se articulando em um todo sem
deixarem de ser fragmentos.
A sala monumental virou este conjunto de fragmentos unificados como se fora um jardim
artificial e lúdico (ou seria uma instalação-oca?) que aponta para uma construção
escultórica em campo antropologicamente ampliado. A própria separação entre natureza e
cultura fica em suspenso e a escultura quer se ampliar como forma ao mesmo tempo
orgânica e artificial. É construção, algo concebido e gerado pelo gesto produtivo, e é
também herança física que se inscreve no corpo (de quem faz a obra e de quem a
experiencia). Trata-se da apropriação de uma memória de materiais e práticas tradicionais,
deslocada pela experimentação plástica que produz relações inusitadas e não contidas
naquela memória.
Um dado importante desta instalação-escultura é sua dimensão processual, seu gosto pelo
gesto arcaico que interfere na superfície do real e se mantém vivo aí, no fazer e não no
produto. Da mesma maneira, há que se atentar para uma experiência-processo que não
sabe o que vê, toca ou sente, mas se dá conta, continuamente, que ver, tocar e sentir são de
outra ordem que não é a do saber. O saber implica uma exterioridade entre eu e coisa que
não se reproduz na experiência da arte, na qual obra e eu estão sempre em transformação.
Como o tempo e a respiração.

Luis Camillo Osorio